Aprovação
de pílula para prevenir doença nos EUA não muda nada no País; para
ministério, Truvada pode ter efeitos colaterais a longo prazo, risco de
baixa adesão e risco de resistência à droga
O
Departamento de DST/Aids do Ministério da Saúde afirmou que não vai
mudar a estratégia de prevenção à doença no Brasil. Nesta segunda-feira,
16, a FDA – agência americana que regulamenta remédios e alimentos –
aprovou a indicação do antirretroviral Truvada como forma de prevenir a
infecção pelo HIV.
Apesar
do otimismo em torno da indicação do uso do Truvada como prevenção,
Ronaldo Hallal, coordenador de cuidado e qualidade do programa de
DST/Aids do Ministério da Saúde afirmou que, por enquanto, nada muda no
País.
De
acordo com ele, o grupo técnico do ministério se reuniu recentemente
para atualizar as diretrizes, discutiu esse assunto, mas decidiu manter
tudo como está, com foco no incentivo ao sexo protegido, no diagnóstico e
tratamento, e na oferta da profilaxia pós-exposição (para pessoas que
fizeram sexo desprotegido com parceiro de risco).
“Os
estudos demonstram que, se a pessoa doente for tratada corretamente, há
uma redução de até 95% na transmissão do vírus. Esse é um resultado bem
mais eficaz do que os 75% alcançados com a profilaxia pré-exposição”,
afirmou Hallal.
O
Truvada é a combinação de dois antirretrovirais: tenofovir com
emtricitabina. A droga é produzida pelo laboratório Gilead e conseguiu o
registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em maio
deste ano. A indicação da droga como forma de profilaxia pré-exposição
ao vírus vem exatamente um ano depois de dois grandes estudos americanos
demonstrarem que o consumo diário de uma dose oral do Truvada pode
reduzir em até 78% a transmissão do vírus para pessoas saudáveis que
mantém relações com parceiros de alto risco, entre elas casais
sorodiscordantes (em que apenas um deles tem o vírus) e homens que fazem
sexo com homens.
Para
Hallal, o Truvada como prevenção ainda tem várias lacunas, como o
aparecimento de possíveis efeitos colaterais a longo prazo, o risco de
baixa adesão e o risco de resistência à droga.
“Estamos
falando de resultados obtidos em estudos controlados, em que as pessoas
são orientadas e acompanhadas a cada 30 dias. Transpor esses resultados
para a vida real, numa política de saúde pública, é totalmente
diferente”, diz Hallal.
Otimismo.
A pesquisadora Valdilea Veloso, diretora do Instituto de Pesquisas
Clínicas Evandro Chagas da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), diz que o
Truvada é uma potencial arma de prevenção da doença, especialmente entre
homens que fazem sexo com homens – grupo de alto risco de contaminação.
Valdilea
afirma ver com otimismo a indicação do uso do Truvada como mais uma
forma de combate à doença de maneira complementar ao que já existe –
como fazer sexo seguro – e não como um substitutivo.
Para
ela, os estudos clínicos demonstraram que não há risco de acontecer a
“desinibição sexual”, que é a pessoa parar de se proteger com
preservativos por acreditar que a medicação sozinha já garantiria a
prevenção.
“Não
podemos generalizar e achar que as pessoas vão fazer mau uso desse
instrumento de prevenção. Além disso, o que o Brasil tem disponível hoje
como política de prevenção à doença definitivamente não deu conta de
controlar o avanço da epidemia. Novos casos surgem todos os dias”, diz a
pesquisadora.
Para
Valdilea, é um retrocesso o fato de o governo afirmar que “nada muda”
na política de DST/Aids sem existir uma ampla discussão com pacientes e
comunidade científica.
“A
OMS está discutindo intensamente esse assunto. O mundo inteiro vê isso
com otimismo. É claro que muita coisa ainda precisa ser discutida, mas
antes de descartar a possibilidade, precisamos ver como as pessoas de
risco percebem a chegada desse medicamento e se elas estão dispostas a
usá-lo ou não”, diz. “Esse foi só o primeiro passo.”
Do Estadão
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